Pessoas ao redor do mundo desencadeiam a liberação de hormônios do bem-estar de maneira muitas vezes imperceptível. Atletas buscam a sensação indescritível da corrida, indivíduos riem com memes compartilhados, casais constroem uma conexão íntima entre os lençóis.
Entretanto, nem todas as atividades físicas estão associadas a reações químicas. Certos comportamentos podem causar mais prejuízos a longo prazo do que benefícios. Além disso, a liberação dessas substâncias químicas nem sempre ocorre naturalmente. Em algumas pessoas, distúrbios genéticos hereditários ou outros fatores podem afetar a capacidade de produzir ou metabolizar hormônios. Para esses indivíduos, a medicação prescrita pode ser não apenas benéfica, mas essencial.
No entanto, para a maioria das pessoas, compreender os gatilhos que naturalmente ativam a liberação de cada substância química pode ser valioso. A seguir, veremos o que funciona (e por quê) para aumentar os níveis de “hormônios da felicidade” de forma natural.
- O que são os hormônios do bem-estar?
O cérebro responde a diversos estímulos ao produzir mensageiros químicos conhecidos como hormônios, que circulam pela corrente sanguínea e afetam áreas específicas do corpo, desencadeando funções ou emoções particulares. Um conjunto de hormônios – dopamina, serotonina, endorfinas e oxitocina – é frequentemente chamado de “hormônios do bem-estar”. A liberação de cada uma dessas substâncias químicas está ligada ao estilo de vida, práticas de exercícios e escolhas alimentares específicas.
A quantidade e o momento da liberação desses hormônios são, em parte, determinados pela associação que uma pessoa estabelece com determinado alimento ou atividade. Por exemplo, a Dra. Anna Lembke, médica e professora de psiquiatria da Escola de Medicina da Universidade de Stanford (EUA), relata que ela adora chocolate e que quando pensa em comê-lo, seu cérebro libera uma dose de dopamina que proporciona uma sensação de prazer. Isso naturalmente “cria motivação ou desejo de comê-lo”, explica ela. Devido à associação básica com o sabor doce, o hormônio não apenas recompensa a pessoa quando ela consome chocolate, mas também a incentiva a procurar mais chocolate sempre que pensar nesse sabor.
No entanto, substâncias químicas como a dopamina não devem estar constantemente presentes e precisam ser “desativadas” para desempenhar seu papel quando surgir uma nova oportunidade. “Se a dopamina de um leão estivesse sempre ativada, ele perseguiria tudo e não teria energia suficiente quando realmente precisasse”, explica Loretta Graziano Breuning, professora emérita da Universidade da Califórnia (EUA) e autora de “Habits of a Happy Brain” (Hábitos de um Cérebro Feliz).
Embora estudos revelem algumas controvérsias sobre como os neurônios produtores de dopamina fortalecem comportamentos aprendidos em comparação com a atração por novos comportamentos, está estabelecido que esse neurotransmissor relacionado ao bem-estar reconhece e recompensa certas atividades mais do que outras.
A dopamina é produzida em duas áreas adjacentes do mesencéfalo conhecidas como área tegmental ventral (VTA, na sigla em inglês) e substância negra. Pesquisas indicam que a principal função da dopamina é atuar como um sistema de recompensa no cérebro.
Realizar desejos alimentares, como chocolate, alcançar metas ou tarefas, e práticas de autocuidado, como correr ou tomar um banho quente, podem desencadear a liberação de dopamina, gerando uma sensação de felicidade e criando o desejo de repetir a atividade ou se voltar ao alimento.
Embora algumas drogas e álcool também possam causar uma liberação de dopamina e criar uma sensação de euforia, “o uso repetido dessas substâncias pode levar a níveis anormalmente baixos de transmissão de dopamina e a um estado de deficiência dopaminérgica, semelhante à depressão clínica”, explica Lembke. Por essa razão, ela sugere que é melhor desencadear a liberação natural de dopamina, fazendo o esforço necessário para liberar o hormônio por meio de atividades como exercícios físicos, “de modo que os níveis de dopamina aumentem gradualmente durante a atividade e permaneçam elevados depois”.
A serotonina é conhecida como “o estimulante natural do humor”, pois baixas concentrações desse neurotransmissor foram associadas à depressão. Por isso, alguns antidepressivos têm sucesso ao aumentar os níveis de serotonina. Estudos também indicam que esse hormônio influencia a memória, melhora as taxas de aprendizado e promove o relaxamento.
Embora pequenas quantidades de serotonina sejam produzidas no tronco cerebral, o hormônio é predominantemente “produzido por células especializadas no intestino”, conforme explica Emeran Mayer, diretor do G. Oppenheimer Center for Neurobiology of Stress and Resilience da Universidade da Califórnia, Los Angeles.
Passar algum tempo sob a luz solar, praticar exercícios físicos e meditar podem desencadear a liberação de serotonina. Tornar-se autossuficiente e cuidar de si mesmo também podem ter esse efeito. “Quando você confia em sua própria capacidade de atender às suas necessidades, o cérebro mamífero recompensa você com serotonina”, destaca Breuning.
Se você já se esforçou para superar a dor de subir uma colina, deve agradecer às endorfinas pelo alívio. Com a raiz da palavra “morfina”, “as endorfinas são os analgésicos naturais do corpo”, informa Breuning. Esse neurotransmissor é sintetizado e armazenado na glândula pituitária, localizada na base do cérebro, atrás da ponte nasal.
Além de ajudar a mascarar a dor, pesquisas indicam que as endorfinas também podem contribuir para a redução do estresse e a melhora do humor.
As endorfinas são liberadas por meio de exercícios físicos, experiências de entretenimento, como música e filmes, e pelo riso. “O ato de rir ativa músculos profundos que normalmente não são muito estimulados, o que provoca uma pequena liberação de endorfinas”, esclarece Breuning.
Esse hormônio também está frequentemente associado à “euforia do atleta”, mas uma pesquisa da Escola de Medicina da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore (EUA), sugere que a euforia após a prática de corrida é mais provavelmente resultado da liberação de outras substâncias bioquímicas (endocanabinoides) que também são produzidas no corpo.
Antes conhecida como o “hormônio do amor”, embora agora se saiba que seu papel é muito mais amplo, a oxitocina é produzida no hipotálamo do cérebro e liberada na corrente sanguínea pela glândula pituitária.
Estudos indicam que sua principal função é auxiliar durante o parto, no período pós-parto e na lactação materna. No entanto, a oxitocina também contribui para melhorar as interações sociais e motiva as pessoas a estabelecerem e desenvolverem conexões mais profundas. Assim, esse hormônio desempenha um papel semelhante nos seres humanos ao que faz em animais.
“Quando um animal fica muito isolado, um predador pode atacá-lo a qualquer momento”, explica Breuning. Por esse motivo, o isolamento naturalmente desencadeia emoções negativas. A oxitocina, por outro lado, “gera uma sensação de bem-estar quando o mamífero volta à segurança do apoio social”.
Kent Berridge, professor de psicologia e neurociência da Universidade de Michigan (EUA), acrescenta que a liberação desse hormônio nem sempre é uma manifestação positiva. Isso ocorre porque a oxitocina também pode aumentar a sensação de ciúme, portanto, “pode promover tanto emoções sociais positivas quanto negativas”, esclarece ele.
O toque físico, como dar as mãos, abraçar ou ter contato sexual, é uma maneira certeira de estimular a liberação de oxitocina. Socializar por meio de conversas, servir aos outros e interagir com animais de estimação também demonstraram aumentar a liberação dessa substância química.
Independentemente do comportamento que desencadeia cada hormônio, Breuning explica que cada um desses hormônios (ou substâncias químicas) é projetado para ser “liberado apenas em curtos surtos”. Quando a substância química é metabolizada, a sensação de bem-estar diminui.
Mayer explica que o efeito das endorfinas e da dopamina dura menos tempo, enquanto os efeitos relacionados à serotonina e à oxitocina “têm uma duração mais longa”.
Independentemente da duração de cada “onda de bem-estar” natural, nosso corpo volta gradualmente aos níveis de base até que uma recompensa ou motivação seja necessária ou buscada novamente. Por isso, Breuning afirma que “sempre precisamos fazer mais para obter mais”.
Com informações da National Geographic Brasil.