Na última sexta-feira (22/9), um pedido de destaque do ministro Alexandre de Moraes interrompeu o julgamento no Plenário do Supremo Tribunal Federal que discutia a possibilidade de suspensão de serviços de mensagens, como o WhatsApp, por descumprimento de ordens judiciais.
Devido a esse destaque, a análise do caso será retomada em uma sessão presencial, ainda sem data definida. Antes do pedido de destaque, o julgamento estava ocorrendo de forma virtual e estava previsto para ser concluído na próxima sexta-feira (29/9). Até o momento, apenas a ministra Rosa Weber emitiu seu voto.
Contexto Histórico:
A Ação Direta de Inconstitucionalidade foi apresentada em 2016 pelo então Partido da República, atualmente chamado de Partido Liberal (PL), questionando alguns dispositivos do Marco Civil da Internet. O partido alegava a inconstitucionalidade da penalidade de suspensão temporária de aplicativos de mensagens, argumentando que esses serviços desempenham um papel social importante.
Os trechos em questão são o parágrafo 2º do artigo 10, que afirma que o conteúdo de comunicações privadas só pode ser disponibilizado mediante ordem judicial, e os incisos III e IV do artigo 12, que prevêem a suspensão temporária e a proibição das atividades de empresas que desrespeitem a lei e os direitos à privacidade.
Esses trechos do Marco Civil foram usados para fundamentar decisões judiciais que ordenaram o acesso a conversas de mensagens e que resultaram na suspensão do WhatsApp em todo o Brasil.
Em maio de 2016, a Vara Criminal de Lagarto (SE) ordenou o bloqueio do aplicativo por 72 horas, após a empresa não cumprir uma ordem judicial para fornecer o conteúdo de conversas relacionadas a uma investigação policial. Posteriormente, o bloqueio foi revertido pelo Tribunal de Justiça de Sergipe.
Em julho do mesmo ano, a 2ª Vara Criminal de Duque de Caxias (RJ) emitiu outra ordem de suspensão do WhatsApp, que foi posteriormente derrubada pelo ministro Ricardo Lewandowski, então presidente do STF. A ação que questiona se a decisão de primeira instância violou a liberdade de comunicação (ADPF 403) ainda está em andamento na Corte Constitucional.
Interpretação de Rosa:
Em 2020, quando apresentou seu voto, a ministra Rosa Weber validou os dispositivos do Marco Civil que estavam sendo contestados, mas se posicionou contra a suspensão de aplicativos de mensagens por ordens judiciais, especialmente qualquer decisão que pudesse enfraquecer a criptografia.
No entanto, a ministra fez uma ressalva, afirmando que é possível que o Judiciário ordene a disponibilização do conteúdo de conversas ou registros de conexão e acesso para auxiliar em investigações criminais. Ela destacou que a Constituição permite a suspensão do sigilo de comunicações privadas apenas em casos de persecução penal.
Além disso, a ministra enfatizou a possibilidade de suspensão temporária ou proibição de atividades específicas das empresas envolvidas na coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, dados pessoais e comunicações privadas. Essas sanções podem ser aplicadas em caso de violação da legislação e dos direitos à privacidade, à proteção de dados pessoais e ao sigilo das comunicações.
Segundo a ministra Rosa Weber, as ordens judiciais que resultaram no bloqueio do WhatsApp ocorreram devido a uma “interpretação equivocada” do Marco Civil da Internet para “práticas que não são por ele amparadas”.
Ela enfatizou que o poder do Estado de ordenar a disponibilização de mensagens em investigações criminais não deve tornar ilegal a prestação de serviços de mensagens criptografadas. A tecnologia de criptografia impede que a própria plataforma acesse tais conteúdos.
Portanto, se um provedor de serviços utiliza a criptografia para garantir a privacidade das conversas, o Estado não pode obrigá-lo a oferecer um serviço menos seguro e vulnerável, alegando a possibilidade de uso dessa vulnerabilidade artificial para cumprir uma ordem judicial. Isso equivaleria a proibir a tecnologia de criptografia e favorecer a exceção (acesso do Estado a conteúdos privados) em detrimento da regra (sigilo das comunicações).