Diversidade de tons, falta de acesso e impacto emocional escancaram a necessidade de uma dermatologia mais inclusiva no Brasil
Quando se fala em cuidados com a pele, é comum que a discussão se restrinja à estética: espinhas, rugas, manchas. Mas a realidade vai muito além do espelho. Para Hanane Saidi, diretora geral da divisão L’Oréal Beleza Dermatológica no Brasil, é urgente entender que questões dermatológicas afetam não só o corpo, mas também a autoestima e a saúde mental das pessoas. “Existem problemas de pele que vão muito além da pele”, afirma.
Um exemplo claro é a acne severa. Para além da dor física e inflamação, ela pode ser devastadora emocionalmente. “Você desenvolve depressão, se sente excluído e se autoexclui da sociedade”, destaca Hanane. Essa intersecção entre pele e saúde mental é estudada por um campo crescente chamado psicodermatologia, que busca compreender como condições dermatológicas impactam o bem-estar psicológico — e vice-versa.
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Inclusão na dermatologia: um desafio brasileiro
O Brasil é um país com uma das maiores diversidades de tons de pele do mundo. Mais de dois terços da população tem pele mais escura ou cabelos crespos e cacheados. Ainda assim, essa pluralidade está longe de ser refletida na prática dermatológica. Falta representatividade nos estudos científicos, nos materiais de ensino e na formação médica — e isso pode custar vidas.
“Melanomas, por exemplo, são muito mais difíceis de detectar em peles negras. Se o médico não tem o preparo adequado, o diagnóstico pode ser tardio ou incorreto”, alerta Hanane. A falta de conhecimento técnico sobre como doenças de pele se manifestam em diferentes tonalidades tem sido um obstáculo para diagnósticos precisos e tratamentos eficazes.
Acesso desigual e formação limitada
Embora o Brasil tenha uma média de 11,1 dermatologistas por 100 mil habitantes, essa distribuição é extremamente desigual. Regiões mais afastadas dos grandes centros sofrem com a escassez de especialistas, e o acesso a tratamentos dermatológicos é, muitas vezes, um privilégio restrito a poucas camadas da população.
Além disso, a formação médica ainda carece de atualização. A maioria dos materiais de ensino apresenta doenças de pele apenas em tons claros, criando uma lacuna grave no atendimento a pacientes negros, pardos e indígenas.
Um novo olhar para a pele brasileira
Para Hanane Saidi, transformar esse cenário começa por um movimento de escuta e representatividade real. “Precisamos entender quem são os brasileiros. É só a partir disso que conseguiremos oferecer uma dermatologia que seja de fato inclusiva”, diz.
Ela defende uma abordagem mais ampla e humana, que considere o impacto emocional das condições de pele, respeite a diversidade e priorize o acesso à informação e ao cuidado de qualidade. “O futuro da dermatologia está em olhar para além da espinha ou da mancha. É enxergar o impacto disso na vida das pessoas e agir com empatia e ciência.”